sábado, 9 de julho de 2011

Projeto 2012 Brasil, Portugal e um corpo nu


A confusão entre o mesmo idioma

Quem foi que disse que falamos o mesmo idioma? Pois eu ofendi, sem querer, um cidadão português!

Estava no bonde, o famoso “Eléctrico 28”, indo descansar um pouco a cabeça e tomar um café no simpático bairro Campo de Ourique, quando ouço um belo discurso político de um senhor falando com um grupo de turistas brasileiros. Ele dizia que o país estava completamente falido e faltava um líder à altura do povo, um povo e um país maravilhosos, e não merecedores dos políticos atuais. Disse que Portugal estava como o Brasil na época da Ditadura Militar.

Conheço bem os meus compatriotas, e sabia que estava diante de um grupo interessado em fazer compras, gastar dinheiro e se vangloriar de estar num “país de Primeiro Mundo falando a própria língua!”. A crise só lhes interessava na medida em que, assim, podiam consumir mais.

Tomei, enfim, coragem, e resolvi intrometer-me. E tentei, de certa maneira, avisar ao digno cavalheiro português que não valia a pena fazer um discurso tão bonito a quem não estava nada interessado. Pois fui inábil... Aproximei-me do cavalheiro e disse:

— Senhor, a sua visão é a de um intelectual de esquerda!

Ele parou de falar, me olhou de modo estranho e disse:

— Intelectual de esquerda?! Não, não sou um intelectual de nada! Sou um humanista, minha senhora...

— Sim, mas o seu discurso é um discurso de esquerda…

— Ora, não existe mais “esquerda” nem “direita”! Existem Opressor e Oprimido!

— Mas isso o que o senhor acabou de dizer equivale a uma visão de esquerda…

Aproximava-se o ponto em que aquele senhor iria saltar do bonde. Ele então me olha nos olhos e, com raiva, já nos últimos degraus do bonde, dispara:

Você [e eu friso aqui a utilização deste pronome de tratamento, que não é lá muito bem visto aqui em Lisboa; quando o aplicam, não é, em geral, significando alguma deferência para com o interlocutor]… Você é muito teórica! Precisa é descer (sic) para a prática!

E foi-se embora.

Fiquei sem reação. Meu coração nem pulou! Não tive tempo de desfazer a confusão. Havia sido eu a culpada, tamanha a minha inabilidade...

E logo eu, que sofro com minha falta de vontade de ser teórica, recebendo esse sermão. Logo eu, que queria dizer ao senhor que sentia e pensava parecido.

É curioso.