sexta-feira, 19 de março de 2010

À Simone

Apresentar os meus trabalhos no ano que completo 40 anos é emblemático. Não deveria mais falar em idade, não deveria falar em gênero...mas como não menciona-los se foram eles os temas que me levaram há exatos dez anos começar a criar? Meus solos durante essa década ajudaram-me imensamente a pensar em amor, casamento, plano de maternidade, trabalho, liberdade e autonomia, com todos seus paradoxos e ambiguidades. Sou grata a capacidade de criar para enfrentar os desafios.
O primeiro trabalho, Á Simone da bela Visão, de 2005 construi a partir da ida a uma consulta médica na qual decidiria se colocaria ou não seios de silicone, constatei perplexa que não conseguiria colocar em mim algo que não envelheceria comigo (veio a imagem de uma velhinha toda encurvada diante do espelho com um lindo par de seios durinhos, como de uma adolescente! Sai correndo do consultório).
No segundo, Maria José, 2007, estava conformada com a peculiaridade de meu corpo andrógino, em que a parte de cima é frágil e a de baixo forte e imponente. Construi esse solo a partir da força erótica das imagens midiáticas que povoam nosso mundo, ora nos ajudando ora nos oprimindo.
No terceiro e último solo, Carmen, 2009, me entreguei a força da graça e sensualidade de um estado feminino de ser, resolvi fazer "uma operação" e troquei meu "órgão masculino" (construído ao longo desses dez para sobreviver a luta pela conquista de espaços) tão forte em mim pelo feminino. Trabalhei com símbolos fetichistas não para critica-los ou nega-los, mas para me ajudar. Amei usa-los, me libertaram. Neste solo conheci Carmen Miranda, revistada pelos tropicalistas, e a elegi como símbolo dessa nova fase, anteriormente tinha as figuras feministas da escritora Simone de Beauvoir e a da cantora Madonna me auxiliando.
Encerro aqui esses temas para não correr o risco de utilizar a arte como substituição de poder.
Agradeço aos muitos amigos presentes nessa solitária trajetória.